Suiça: a crise ameaça a poderosa classe média
por Simon Bradley
07.05. 2010
Quatro entre dez famílias da classe média na Suíça têm dificuldades em terminar o mês com as despesas pagas e são incapazes de economizar dinheiro, como revela uma pesquisa recente. A situação é ainda mais difícil para metade das famílias da classe média baixa. Entretanto, a maioria dos entrevistados estão otimistas em relação ao futuro apesar da crise econômica. É o que revela a revista "Beobachter".
De acordo com a pesquisa organizada pelo instituto Gfs.Bern, 85 por cento das famílias acreditam que a situação econômica se manterá no nível atual durante os próximos cinco anos. Apenas uma família em dez acredita que a situação irá piorar.
Porém, por traz desse otimismo está outra realidade.
Cerca de 38% das famílias de classe média, que representam 60 por cento da população suíça, estão "apertadas" financeiramente.
"Beobachter", uma revista suíça de consumidores, define uma família de classe média como aquela cujo chefe tem rendimento entre 2.450 e 5.250 francos suíços (respectivamente, 2.261 e 4.846 dólares).
"Parte da classe média passa por dificuldades desde que as despesas, incluindo as do seguro de saúde, cresceram mais rápido do que os salários nos últimos anos", avalia Dominique Joye, sociólogo da Universidade de Lausanne.
Daniel Lampart, economista-chefe da Federação Suíça de Sindicatos, também acredita que um número crescente de famílias da classe média "mal paga as contas no final do mês".
Pressões
De acordo com “Beobachter”, os salários médios aumentaram 12 % nos últimos quinze anos, enquanto aluguéis cresceram 16 % ou até mais nas cidades. E os aumentos sucessivos nos preços dos seguros de saúde fazem uma família de quatro pessoas gastar atualmente média de 1.500 francos mensais, ou mais.
Críticos argumentam que o sistema fiscal no país não está mais adequado à situação das famílias da classe média.
Um estudo realizado pela Universidade de St. Gallen ano passado mostrou que quanto maior a renda de um dos pais, menos rentável se torna a segunda renda familiar. Razão: os custos relacionados à guarda das crianças e impostos caem desproporcionalmente sobre a segunda folha de pagamento.
O governo afirma que a isenção fiscal para as famílias de classe média é uma prioridade e propôs, em maio passado, reformas para dar 600 milhões em isenções fiscais diretas às famílias com crianças.
Carros versus crianças
A pesquisa da “Beobachter” mostra que famílias sob pressão financeira estariam mais dispostas a abandonar os planos de ter outra criança do que ter seu automóvel.
Mais de 50 % afirmaram que seria "extremamente duro" e 29 % "difícil" de viver sem um veículo, enquanto 70 % acreditam que poderiam enfrentar bem uma piora da situação financeira sem outro filho.
Apesar das dificuldades financeiras, o futuro das crianças continua sendo uma prioridade. Cerca de 49 % dos entrevistados afirmam que não deixariam de pagar as aulas particulares dos seus filhos. Já 47 % consideram importantes as aulas de músicas e 33 %, que computadores são objetos essenciais no quarto dos filhos.
As férias anuais de esqui ou viagem ao exterior são também importantes para as famílias de classe média na Suíça. Abandonar as férias seria "muito difícil" para 16% das famílias e "um tanto difícil" para 37 %. Mas existe uma "diferença crescente" entre as aspirações da classe média e o que certas categorias de pessoas estão vivenciando atualmente, afirma Joye.
Apertado
As maiores preocupações em relação ao futuro estão ligadas à situação de emprego e o influxo de mão de obra estrangeira, revelou a pesquisa. Cerca de 31 % afirma ter "sérias" preocupações em relação à sua renda ser afetada por estrangeiros que obtém empregos na Suíça.
"Embora silenciosa, a classe média 'apertada' expressa atualmente suas frustrações através das urnas como, por exemplo, na proibição 'xenófoba' de estrangeiros e iniciativas contra as classes ricas como na proposta de controle das bonificações de banqueiros. Essas questões podem ser facilmente instrumentalizadas por partidos políticos", afirma o professor de sociologia da Universidade de Genebra, Sandro Cattacin.
"A classe média na Suíça, assim como em outros países europeus, está sendo espremida por todos os lados. Os pobres estão se tornando um pouco mais ricos e os ricos mais ricos ainda. “Se tornou desconfortável pertencer a classe média, sobretudo através do medo de descer na escala social", analisa Cattacin.
http://www.swissinfo.ch/