Narco-sub
por Augusto Freitas de Sousa
12.07.2010


A imaginação dos traficantes não tem limites. Os submergíveis adaptados ao tráfico estão cada vez mais na moda

Durante anos, os pequenos submarinos (mais correctamente, submergíveis) que transportavam droga da América do Sul para os Estados Unidos não passaram de um rumor.

Até que em 2006 a Guarda Costeira norte-americana encontrou uma dessas embarcações ao largo da Costa Rica, carregada com toneladas de cocaína. Desde então e até ao mês passado, todos os anos foram duplicando as apreensões de submergíveis - narco-subs, como são conhecidos - e, segundo os peritos, as detecções representam cerca de 3% das viagens efectuadas.

A polícia espanhola confirmou ao i que a 13 de agosto de 2006 encontrou um desses submergíveis abandonado numa praia, embora a sua localização não tenha sido divulgada. Em maio passado foi a vez de o comandante da marinha inglesa lançar o alerta: os traficantes vão começar a usar submarinos para transportar droga para Inglaterra. Outra das descobertas recentes das autoridades é que uma das redes que utilizam estas embarcações na América do Sul tem ligações à máfia russa.

No nosso país [Portugal], é uma questão de tempo até aparecerem os narco-subs, como refere um dos maiores especialistas em navegação debaixo de água, o comandante da esquadrilha de submarinos portugueses, Gouveia Melo. O militar tem quase "a certeza que em Portugal nunca foram detectados submergíveis desse tipo", mas não afasta a hipótese de, "dentro de pouco tempo, ser possível que tal aconteça".

Conhecedor da luta contra o narcotráfico, Gouveia Melo confirma que a Marinha é responsável por centenas de operações que resultam em apreensões de grandes quantidades de droga. Os submarinos, ao longo dos últimos anos, explica, "detectaram centenas de operações e movimentações, mas nunca intervêm directamente". Recolhem informações, rotas, movimentações e reportam às autoridades.

O papel da Marinha é muitas vezes desconhecido dos portugueses. O comandante disse ao i que, de uma forma simples, no mar "o cérebro é a Polícia Judiciária e a Marinha o braço musculado". As operações do Destacamento de Acções Especiais (DAE), a elite do Corpo de Fuzileiros, nunca são notícia, mas envolvem quase uma centena de homens altamente treinados que estão envolvidos nas apreensões de droga. Capaz de abordar um barco pelo ar ou por baixo de água e de neutralizar os ocupantes, o DAE caracteriza-se pelo elevado secretismo no que diz respeito às actuações, organização interna e composição.

Fabrico caseiro
Os narco-subs que têm sido apanhados em todo o mundo são na maioria de fabrico caseiro, habitualmente de fibra de vidro, madeira ou aço, com uma dezena de metros, capacidade para transportar cerca de 5 toneladas de cocaína, a uma velocidade de 10 quilómetros por hora e alcances de 3 mil quilómetros com motores a diesel - esta última característica implica que não podem submergir porque o motor tem de receber ar do exterior.


As embarcações ficam à superfície, apenas com uma pequena torre fora de água, o que torna praticamente impossível os barcos e os aviões detectarem os seus movimentos.

São extremamente móveis e, como explica Gouveia Melo, o meio mais eficaz para os detectar são os submarinos. Os aviões raramente avistam objectos tão diminutos e o sonar dos barcos, devido à pequena dimensão dos narco-subs, pode não os captar. Além disso, acrescenta o militar, a fiabilidade do sonar depende da temperatura do mar.

Relativamente aos submarinos, Gouveia Melo, sem entrar em pormenores que considera reservados, esclarece que os actuais submarinos da Marinha conseguem detectar facilmente o ruído da hélice dos narco-subs. Apesar de terem uma autonomia limitada, a sua utilização não está confinada às rotas entre a América do Sul e do Norte. Podem facilmente ser transportados e dissimulados num cargueiro e servir apenas para os desembarques de droga mais perto das costas da Europa e de África.

O comandante da esquadrilha de submarinos portugueses acrescenta ainda que a tecnologia militar não está disponível para privados, mas manifestou a sua preocupação com o desmantelamento da frota da ex-União Soviética.

Upgrade

Uma recente apreensão veio alterar o paradigma. Os narco-subs mais conhecidos não dispunham de muita autonomia, tinham de permanecer à superfície e deslocavam-se lentamente. Até agora.

Durante o passado mês de junho, a polícia do Equador, depois de ter recebido informações das autoridades americanas, apreendeu um submarino pronto para navegar num estaleiro dissimulado na selva, perto da fronteira com a Colômbia.

Os agentes da agência americana de combate ao tráfico - Drug Enforcement Administration (DEA) - referiram que o submarino estava totalmente operacional e representa, segundo a DEA, um salto tecnológico que aumenta exponencialmente a capacidade do tráfico.

Segundo as primeiras informações da DEA, o submarino detectado no Equador foi construído em fibra de vidro, tem cerca de 30 metros de comprimento, três de altura, capacidade de mergulhar a uma profundidade de 20 metros, autonomia para dez dias de viagem e capacidade para transportar mais de 10 toneladas de cocaína.
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