Lello. Os segredos da terceira
melhor livraria do mundo

por Margarida Silva
19.11. 2010

Ontem esteve nas bocas do mundo por ter ficado em terceiro lugar numa lista do "Lonely Planet", mas isso não alterou o dia do seu dono. Antero Braga fez-nos uma visita guiada à Lello
A Lello não é uma livraria qualquer. É "a" livraria do Porto. E do mundo. Tanto é, que foi considerada a terceira melhor do mundo pelo popular guia de viagens "Lonely Planet''s Best in Travel 2011".
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Quinze anos depois da mudança de gerência, a livraria continua a aproveitar a estrutura arquitectónica que atrai milhares de visitantes e reforça uma reputação que mantém há mais de cem anos.

Esta não é a primeira vez que a Lello é destacada por uma publicação internacional. Há dois anos, o jornal britânico "The Guardian" já a tinha homenageado com o terceiro lugar no ranking de melhores livrarias do mundo.

Antero Braga, proprietário e actualmente o homem forte por detrás do nome Lello, explica que a receita para o sucesso passa por encontrar o equilíbrio interior entre o seu papel de amante de cultura e o outro, mais austero, o de gestor.

Directo ao assunto, Antero Braga explica que esta não é a sua livraria ideal, uma vez que não abrange todas as áreas temáticas que desejava, mas o lado de gestor diz-lhe que só fazendo concessões é possível tornar a livraria num negócio viável. "Se não o fizeres estás condenado, quase como acontece com o país", confessa.

Há 41 anos a trabalhar em livros, Antero não esconde o orgulho que sente com o seu espaço, a sua profissão e com a reputação de qualidade da sua livraria. Foi há 15 anos que assumiu a gerência da Lello, e quando a encontrou estava longe de ser o marco que é agora. "A Lello enquanto editora foi muito mais conhecida do que propriamente enquanto livraria", explica.

Foi o seu percurso de gestor na Bertrand que o ajudou a recuperar o espaço. "Fui o gerente mais novo da Bertrand, o director comercial mais novo da Bertrand, o administrador mais novo da Bertrand e sou cá do Porto", contou.

A Lello é, aliás, um espaço tipicamente portuense, onde é cultivada e mostrada a essência da cidade. A máxima deste espaço passa por criar uma ligação "intensa de amizade"com os seus clientes. Antero Braga crê que é aqui que reside o espírito da Invicta. "No Porto é mais difícil por vezes penetrar no meio, mas depois tem-se amigos para a vida", diz.

O facto de ter preservado o ambiente íntimo e personalizado fez com que a livraria se tornasse um dos marcos de atracção da cidade, quer para o comum turista quer para figuras ilustres. Ao longo da sua vasta história, já por lá passaram nomes como Afonso Costa, Cavaco Silva (escolheu a Lello para lançar a sua autobiografia), Mário Vargas Llosa (ainda antes de receber o prémio Nobel), Alain Juppé, antigo primeiro-ministro francês, ou Marcelo Caetano, o último homem-forte do Estado Novo.

"Cada um tem o seu feitio, e as pessoas gosta de ter um interlocutor, alguém que os aconselha", diz Antero Braga. Na Lello têm o tratamento personalizado que está a desaparecer do comércio contemporâneo. O gestor da livraria conta que várias personalidades, como Diogo Freitas do Amaral, usam o seu gabinete, onde guarda algumas raridades.

Antero Braga orgulha-se das amizades que cultivou ao longo da sua carreira. Conta com carinho o encontro que teve com José Saramago, em que lhe confessou que o seu livro preferido do autor era o "Levantado do Chão" e não o "Memorial do Convento". Ao que o Nobel português respondeu: "Também é o meu."

As distinções que a Lello vai acumulando fazem dela um ícone da cidade. Se cada visitante que se extasia com a sublime escadaria do espaço comprasse um livro, em termos comerciais era um êxito fenomenal. Assim, é uma livraria que resiste com o passar dos tempos e que o mundo reconhece. Mais do que os portugueses, diga-se.
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