A SUCESSÃO DE LULA

Brasil. Corrupção aquece debate presidencial

por Gonçalo Venâncio
14.09.2010

Instantâneos das presidenciais a 20 dias das eleições. Como será o Brasil depois de Lula? Com Dilma ou com Serra?

"Break a leg!", dizem os anglófonos numa manifestação de desejo de boa sorte. Se alguém no staff de Dilma Rousseff fez a mesma formulação, a propósito da participação da candidata presidencial no debate de domingo, esse desejo teve uma concretização demasiado literal: Dilma conseguiu não perder o debate para o seu principal adversário, José Serra, do PSDB, mas torceu o pé direito e apareceu nas acções de campanha de ontem com meia perna imobilizada por uma bota ortopédica. "Nada de grave", atestou o médico que assistiu a protegida de Lula da Silva. Tanto física como politicamente, Dilma continua em boa forma.

No serão de domingo, os brasileiros tiveram direito a mais um capítulo da novela política que acabará com a eleição do novo inquilino do Palácio do Planalto, previsivelmente a 3 de Outubro, data da primeira volta. Num debate aceso, Dilma e Serra trocaram acusações duras sobre o tema que tem dominado os últimos dias de campanha: a corrupção. A revista "Veja" noticiou o envolvimento do filho da ministra-chefe da Casa Civil Erenice Guerra - sucessora de Dilma - num esquema de tráfico de influências em que, beneficiando da posição da mãe, ganharia comissões em contratos fechados entre empresas privadas e o governo federal.

"A democracia do PT e de Dilma é a democracia de usar o aparato legal para proteger os companheiros e atacar os adversários" disparou o tucano José Serra, aludindo também a um caso de quebra de sigilo fiscal de elementos do PSDB. A petista Dilma defendeu-se como pôde, afirmando que as denúncias da "Veja" têm de ser investigadas e, a confirmarem-se, punidas, "doa a quem doer".

Revelações capazes de afectar a dinâmica da mulher que os marketeers tentam vender como a Lula de saias?
"Não creio. A candidatura de Dilma reflecte aquilo que foi a administração Lula: um governo teflon, onde nada gruda" explica ao i Marcus Vinicius Freitas. "Além do mais, a população está mais preocupada com saúde, educação e habitação e não liga a estes casos de corrupção porque, no fim de contas, pensa que todos os políticos são corruptos", acrescenta o professor de Relações Internacionais da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP).

Que Brasil depois de Lula? Dilma, a “Joana d' Arc da guerrilha", segue à frente nas sondagens com 50% das intenções de voto e pode pôr um ponto final nas eleições, logo a 3 de Outubro. Ao mesmo tempo, com 27%, o ex-governador de São Paulo e ex-ministro da Saúde, José Serra, tenta diminuir a distância. Mas, para Marcus Freitas, parece estar a seguir uma estratégia errada: "Serra não apresenta medidas. Fala dos genéricos, dos genéricos e dos genéricos não sabendo como ligar-se com a população. E depois, tem outro problema. O PSDB não soube fazer oposição."

Para o professor da FAAP, o próximo governo vai ter de lidar com dois problemas. O primeiro, de expectativas: "Quem sucede nestas condições não consegue ter o pé do tamanho da bota herdada", disse, numa referência aos mandatos de Lula. E o segundo, de consolidação de contas públicas em virtude do aumento das despesas e do próprio aparelho de Estado. Um problema completamente fora do debate porque, diz Marcus Freitas, "os dois partidos partilham a mesma agenda".

Mas, no governo, as diferenças seriam mais claras, explica o professor. Como seria um Brasil liderado pelo social-democrata Serra? "Mais intervencionista, sem dúvida. Com mais privatizações mas mais intervenção do Estado e favorecimento de determinados sectores industriais." No domingo, poucas foram as intervenções de Dilma em que Lula não tivesse sido chamado. É a Dilma que compete fazer o terceiro mandato de Lula. "Com Dilma não teremos nada de muito diferente. É business as usual" conclui Freitas.
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