LIVRO

Ken Follet. "Não tinha dinheiro para consertar o carro, escrevi um livro"
31.07. 2010

Foi um jornalista mediano até o seu carro se avariar. O autor de "Os Pilares da Terra" explica como nasceu o bestseller, agora adaptado à TV

Incluir o seu nome numa lista de bestsellers parece hoje em dia uma tarefa fácil para Ken Follett, porém só depois de várias tentativas é que este autor conseguiu lá chegar. Follett passou grande parte dos anos 70 a trabalhar como jornalista e editor de livros no Reino Unido antes de escrever os seus primeiros romances - nenhum deles vingou.

A reviravolta aconteceu em 78 com "O Buraco da Agulha", um thriller de espionagem passado na Segunda Guerra Mundial assente numa pesquisa meticulosa. "Os Pilares da Terra", o seu épico de 89 sobre a construção de uma catedral na Grã-Bretanha medieval, foi outro grande êxito, seleccionado para o Clube do Livro da Oprah e gerando uma sequela em 2007, "Um Mundo Sem Fim". "Os Pilares da Terra" também foi adaptado à televisão numa mini-série que estreou recentemente nos EUA. O elenco inclui Ian McShane, Donald Sutherland e Rufus Sewell.

Que conselho daria às pessoas que acham que as suas carreiras não têm segundo e terceiro actos?

Bem, para as pessoas que querem escrever bestsellers, o melhor conselho que posso dar é que o romance tem de cativar o leitor emocionalmente. Todas as coisas dramáticas que acontecem nos thrillers - perseguições, interrogatórios, engano, romance - só funcionam se os leitores se preocuparem com as pessoas envolvidas. Dois homens a lutar ao murro pode ser mecânico e aborrecido, como ver dois bêbedos a bater-se na rua.

Quando ainda era jornalista o que o levou a escrever o primeiro livro?

O estímulo foi uma crise financeira. O meu carro avariou e não podia arranjá-lo. Outro repórter do jornal tinha escrito um thriller e havia recebido um adiantamento de 200 euros, que era exactamente a quantidade de dinheiro que precisava para arranjar o carro. Não me tinha apercebido, até a vida me mostrar, que era um jornalista mediano e que podia ter qualquer coisa especial como escritor.

Não parece ter problemas em mostrar confiança no seu trabalho, o que não encaixa muito bem no estereótipo do escritor inseguro.

No princípio da carreira o meu agente disse-me: "Sabes, o teu único problema como escritor é não seres uma alma atormentada." E é verdade. Muitas pessoas escrevem a partir de uma dor interior. E eu, geralmente, sou um ser alegre.

O que o inspirou a escrever "Os Pilares da Terra", isto é, 900 páginas sobre a construção de uma catedral gótica?

Um dia fui ver uma dessas grandes catedrais e fiquei impressionado. A partir daí interessei-me pelo processo de construção das catedrais, depois interessei-me pela sociedade que construiu a catedral. A determinada altura, ocorreu-me que a história da construção de uma catedral podia ser um grande romance popular. Nem toda a gente concordou.

Quanto tempo demorou a escrevê-lo?

No total, três anos e três meses. Ao fim de dois anos só tinha 200 páginas e senti que estava em crise. E como romancista, a única coisa que se pode fazer para escrever mais depressa é trabalhar mais horas. Então comecei a escrever aos sábados e depois também aos domingos. A dificuldade é apenas a de que temos de estar sempre a inventar mais e mais coisas sobre as mesmas pessoas. Se escrevemos 100 mil palavras de um thriller, está terminado. Só que 100 mil palavras de "Os Pilares da Terra" é tanto quanto isto [abre o primeiro quarto do livro] Essa foi a grande dificuldade.

Foi difícil vender uma obra tão longa para adaptação à televisão ou ao cinema?

Estipulei que só venderia para seis ou oito horas de televisão e, na verdade, isso foi um impedimento para alguns acordos. Tivemos negociações com umas quantas pessoas sobre os direitos, em que elas diziam: "Contratualmente, para o caso das coisas darem para o torto, temos de ter o direito de fazer um telefilme de quatro horas ou mesmo de duas." Mas como é um livro tão especial para mim, estabeleci essa condição e isso impediu-nos de conseguir um acordo até o Ridley [Scott] aparecer e dizer: "Sim, comprometo-me com as oito horas."

É difícil para um autor ver o seu livro modificado e condensado no processo de adaptação?


Não é muito difícil. Olhamos para o actor e dizemos "Ó, meu Deus, não o imaginava com esse aspecto." Matthew Macfayden, por exemplo - na minha cabeça, o prior Philip é um homem pequeno, frágil. A sua força vem da determinação da sua coragem moral. E Matthew Macfayden tem o quê, 1,95 m? É extraordinariamente atraente. Por isso, inicialmente pensamos: "Matthew Macfayden?" Mas aceitamos. Não me importo nada. Diverte-me.

A seguir gostaria de escrever uma coisa um pouco mais pequena?

Tenho um novo livro que irá sair a 28 de Setembro, chamado "Fall of Giants". É um retrato de cinco famílias, uma russa, uma alemã, duas britânicas e uma americana, e segue os seus destinos durante a Primeira Guerra Mundial, a Revolução Russa e a luta pelos direitos da mulher. E é o primeiro de uma trilogia que, espero, contará a história do século XX.

Já recebeu feedback crítico dos seus editores em relação ao livro?

Peço-lhes - exijo-lhes - respostas críticas. Certamente, recebo isso do meu agente.
http://www.ionline.pt/